A
PSICOLOGIA ESCOLAR EM UM CENTRO DE EDUCAÇÃO ESPECIAL: DESAFIOS DIANTE DA
INCLUSÃO
THE SCHOOL PSYCHOLOGY IN A
CENTER OF SPECIAL EDUCATION: CHALLENGES BEFORE INCLUSION
Ludmilla
Muniz Machado* – FSA - E-mail: ludmillapsicologia@yahoo.com.br
Maria
da Glória Santos Ferreira* – FSA- E-mail: gloria.ferreira@bol.com.br
Maria
do Socorro Cardoso Soares Mendonça* – FSA- E-mail: socorromendoncaibt@bol.com.br
Orientadora:
Prof.ª Ms. Patrícia Melo do Monte** – FSA/CIES- E-mail:
patriciamelo2000@gmail.com
RESUMO
Este trabalho tem como finalidade descrever as experiências
vividas por cinco acadêmicas, do oitavo período, do curso de Psicologia,
durante o Estágio Supervisionado em Psicologia Escolar, realizado em uma
instituição de Educação Especial, da rede pública, localizada
na cidade Teresina, Estado Piauí. O estágio cumpriu uma exigência curricular e teve
como objetivos principais compreender a estrutura e todo o funcionamento
interno de uma instituição escolar, assim como, avaliar criticamente as
possibilidades de atuação do psicólogo inserido neste contexto. Como recursos
metodológicos, foram utilizadas entrevistas semiestruturadas, relatórios de
observações e consultas a documentos institucionais, a fim de obter dados sobre
a metodologia de ensino, os serviços técnicos prestados e os espaços destinados
à atividade pedagógica e lúdica. Diante dos resultados, as alunas puderam,
então, propor intervenções que pudessem viabilizar mudanças/melhorias no
tocante a um desenvolvimento mais saudável de crianças com necessidades
educacionais especiais e suas respectivas famílias. Como sujeitos diretamente
envolvidos na instituição escolar, a equipe pedagógica também foi assistida em
suas demandas, com um trabalho voltado para atividades de relaxamento e treino
de resiliência. E considerando
os pensamentos de González Rey (2008), Mitjáns Martínez (1997), Vigotski (1999),
dentre outros autores, as alunas realizaram
acompanhamento de casos apresentando uma proposta de revisão metodológica do
processo de avaliação da aprendizagem, visto que a necessidade é de compreender
o aluno como um sujeito ativo, reflexivo e emocional, implicado em seu processo
de aprendizagem. O estágio cumpriu seu objetivo, uma vez que
possibilitou experienciar a prática de aprendizados teóricos anteriores.
Palavras-chave: Psicologia
Escolar. Educação Inclusiva. Subjetividade.
ABSTRACT
This report
seeks to describe the experiences undergone by five students from the 8th
(eighth) semester of Psychology course, during the Supervised
Training in School Psychology, which took place at in an
institution of Special Education, the public, located in the city of Teresina, Piauí state. The
training fulfilled one of the curricular requirements and had as a main
objective to comprehend the structure and all the inner workings
of an educational institution, as well as critically evaluate the possibilities
for the psychologist to act within that context. As methodological resources
the team used semi-structured interviews, observation reports and consultation
to institutional documents, in order to obtain data about the teaching
methodology, technical services provided, spaces for pedagogical and leisure
activity. Acting upon the outcome of that work, the students could then propose
interventions that could enable changes/improvements regarding a more
healthy development for kids with special educational needs and their families.
As subjects directly involved in the educational institution, the pedagogical
team was also assisted in its demands. Due to the stress the team found itself
in, the work was oriented to relaxation activities and resilience
training. By considering the thinking of González Rey (2008), Mitjáns Martínez
(1997), and Vygotsky (1999), among other authors, the students also carried out
monitoring of cases while presenting a proposal of methodological revision in
the process of learning evaluation, since there is a need to comprehend the
pupil as an active, reflexive and emotional subject who is inserted in his or
her learning process. The goal of the training was fulfilled, since it enabled
the team to experience the practice of earlier theoretical learning.
Keywords: School Psychology. Inclusive Education.
Subjectivity.
1.
INTRODUÇÃO
O curso de Graduação em
Psicologia da Faculdade Santo Agostinho – FSA em Teresina-PI possui um total de
cinco estágios curriculares, dentre eles o Estágio Supervisionado em Psicologia
Escolar. Este Estágio, que aqui relataremos, foi realizado por um grupo de
cinco acadêmicas do oitavo período, do curso de Psicologia, em um Centro de
Educação Especial, também localizado na cidade de Teresina. Desenvolveu-se em um período de aproximadamente (três)
meses e meio, de agosto a dezembro de 2010, cumprindo uma carga horária
de 180 (cento e oitenta) horas, dividida em 100 (cem) horas de trabalho de
campo, 60 (sessenta) horas de supervisão da faculdade e 40 (quarenta) horas
para o planejamento das atividades e elaboração de relatório de estágio. No
total, a exigência curricular para a atividade de campo foi excedida em 40
(quarenta) horas. Importante ressaltar que, durante o seu desenvolvimento, as
alunas estiveram sob supervisão da Prof.ª Patrícia Melo do Monte, psicóloga escolar na referida instituição de estágio.
O campo de estágio
constitui-se um centro de Educação Especial, vinculado à Secretaria de Educação
e Cultura - SEDUC, através da Gerência de Educação Especial - GEE, em parceria
com a Secretaria Estadual para Inclusão da Pessoa com Deficiência – SEID da
cidade de Teresina, Estado do Piauí. O prédio do Centro é subdividido em
setores: setor de atendimento técnico especializado e setor de atendimento
pedagógico especial. Ainda na formatação de sua estrutura dispõe de setor
administrativo composto por Diretoria e Coordenação.
Busca oferecer um
serviço especializado de qualidade àqueles que necessitam de um atendimento
especializado como condição de extrema importância para as exigências do
processo educacional. O trabalho consiste na gestão de novas práticas
educativas que se configuram, numa correspondência justa, às demandas de uma
sociedade plural, com necessidades e interesses particulares. O Centro é
organizado de forma a prestar Atendimento Educacional Especializado – AEE,
Assistência Terapêutica e Esportiva e desenvolve suas ações e práticas fundamentadas
na política da inclusão.
Projetado inicialmente
para atender a 400 crianças com deficiência intelectual, associada ou não a
outra deficiência, o Centro ultrapassou a sua meta, atendendo atualmente 420
crianças, na faixa etária de 0 a 14 anos, distribuídas em dois turnos, manhã e
tarde, sendo o atendimento dividido em sistema de rodízio: as crianças vão para
o Centro, em média, dois dias na semana, divididas da forma a seguir: segunda-feira
e quarta-feira; terça-feira e quinta- feira, e dependendo da necessidade de cada
criança, às vezes também na sexta-feira.
O Centro, objetivando
implementar um trabalho direcionado à execução das metas propostas, organizou
sua dinâmica de atendimento por núcleos, que se dispõem da seguinte
forma:
ü NÚCLEO DE ESTIMULAÇÃO ESSENCIAL –
NEES: A Estimulação Essencial atua em crianças de 0 a 04
anos, que apresentam qualquer alteração que acarretem Deficiência Mental.
Funciona com os setores de Fisioterapia, Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional e
Psicologia. O objetivo do tratamento é a adequação do controle motor a partir do
aprendizado motor, que é conseguido através de repetições e prática de modelos
adequados de movimentos e experiências sensoriais, perceptuais, cognitivas,
sociais e afetivas, visando ao desenvolvimento normal com funcionalidade e
independência.
ü NÚCLEO DE ATENDIMENTO INTENSIVO –
NAI: O NAI tem como propósito prestar atendimento às
crianças do Centro que estão em processo de inclusão. Visa, através da
intervenção intensiva de uma equipe multidisciplinar, a desenvolver as
necessidades especificas desses aprendentes numa perspectiva de que no futuro
as mesmas possam ser inclusas nos espaços sociais e educacionais.
ü NÚCLEO DE ATENDIMENTO PEDAGÓGICO
ESPECIALIZADO – NAPE: Consiste num modelo de intervenção
estratégica de orientação cognitiva, através de atividades que permitam aos
aprendentes utilizarem com mais eficácia suas competências na aquisição de
novos conhecimentos.
ü NÚCLEO DE ATENDIMENTO SOCIOCULTURAL
E TECNÓLOGICO – NASCT: Auxilia na valorização dos papéis
sociais, compreendendo o desenvolvimento de habilidades pessoais e a
constituição de uma identidade individual e social, primando pela inserção dos
mesmos no mundo globalizado a partir da interação com os recursos materiais e
humanos que fazem parte deste contexto.
ü NÚCLEO DE APOIO À FAMÍLIA – NAF: Propõe-se
a contribuir com o enfrentamento dos problemas psicológicos e sociais
decorrentes de uma dinâmica familiar permeada de necessidades especiais com os
objetivos de oferecer apoio psicossocial às famílias assistidas pelo Centro.
ü NÚCLEO DE FORMAÇÃO CONTINUADA –
NUFOCO: Promove uma gestão de conhecimentos visando à
implementação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de dezembro de
1996, que se refere em diversos artigos, à formação continuada do profissional
envolvido com a educação. Trabalha com a formação docente com o objetivo de
responder aos desafios de maximizar o potencial de aprendizagem dos alunos,
como produção de recursos técnicos que auxiliem a dinâmica de trabalho da
equipe multiprofissional, através da organização de seminários, dia de estudo,
oficinas, grupos de trabalhos e outros. Desta forma, visa a garantir um maior
rigor científico à prática dos profissionais envolvidos no atendimento da
criança com deficiência intelectual (DI).
ü NÚCLEO DE PRODUÇÃO DE MATERIAL
PEDAGÓGICO – NUPREP: O material é criado conforme as
habilidades e competências que os aprendentes precisam desenvolver e tem como
objetivo propiciar seu desenvolvimento integral. São produzidos vários
materiais baseados nas experiências e vivências das crianças e adolescentes com
DI, e que ajudam aos professores interagir com as crianças facilitando o
desenvolvimento destes, de forma lúdica e criativa. As possibilidades de
utilização dos materiais não se esgotam, pois cada professor e cada aluno podem
reinventar novas formas de utilizar e explorar a proposta inicial.
ü NÚCLEO DE APOIO À EDUCAÇÃO
INCLUSIVA – NAEI: Apóia, avalia orienta e encaminha
famílias que se encontram necessitando de esclarecimento acerca da Educação
Inclusiva, através de atendimento no Centro, como também realizando palestras
na Rede Estadual de Educação, desmistificando os preconceitos e derrubando
barreiras.
O
Centro tem como missão oferecer atendimento educacional
especializado como condição para atender às exigências atuais do processo
inclusivo, a produção de materiais acessíveis e a formação em exercício dos
profissionais do centro.
2.
PSICOLOGIA
ESCOLAR
Pensar a Psicologia
Escolar nos dias de hoje é certamente reconhecer a existência de um campo
vasto, complexo, porém, de vital importância, de que se ocupa a Psicologia. É
uma área que vem se disseminando e se consolidando e por assim dizer, sendo
ocupada pelos profissionais da Psicologia de maneira mais rápida que antes.
Nessa consolidação, no entanto, vão surgir algumas preocupações, das quais devem
se ocupar os estudiosos da área, tal qual o domínio teórico e prático no campo
educacional aliado aos conhecimentos da Psicologia e ainda com a inserção
crítica e real do Psicólogo Escolar na educação.
O psicólogo escolar é o
especialista que irá trabalhar com pessoas sobre os problemas que ocorrem com
toda a comunidade escolar, devendo este conhecer as forças que influenciam as
escolas bem como o modo de resposta das pessoas por elas afetadas. Ele deve,
portanto, atuar de acordo com as necessidades das mais diversas instâncias da
escola: em pesquisas; assessoramento à direção, equipe técnico-pedagógica,
supervisão escolar; orientação vocacional/profissional e corpo docente; nos
inter-relacionamentos do corpo técnico, corpo discente e famílias; e ainda nos problemas
de aprendizagem e orientação a pais (COSTA; RONCAGLIO; SOUSA, 2005).
Novos olhares sobre a
educação possibilitaram no cenário nacional a criação da Lei de Diretrizes e
Bases 9.394/96 que tratava da educação inclusiva e na mesma lei destacamos aqui
o artigo 71 que estabelece a psicologia como “despesas educacionais”
apresentando no inciso IV a inserção do psicólogo entre muitos serviços
assistencialistas na área educacional; então, legalmente está impossibilitada a
formalização da inserção do psicólogo no quadro funcional das escolas (DEL
PRETTE, 2002). Porém, mesmo com os entraves legais, pouco a pouco o psicólogo
vem mostrando a importância e o resultado de suas intervenções nas questões
educacionais.
A lei passou por alguns
ajustes, que foram realizados à medida que surgiram outras demandas não
esclarecidas pela LDB. Então surgiu em 2001, o decreto 3.956 com base na lei
anterior e na Convenção da Guatemala. Esta lei pôs fim às interpretações
confusas e debates inócuos gerados em torno da LDB, pois clarificou o devido
tratamento a ser dispensado em qualquer caso de deficiência. As modificações na
lei apresentaram aos profissionais a possibilidade e também o desafio de aliar
a teoria à prática, portanto, a necessidade de redimensionar a graduação de futuros
profissionais principalmente os de psicologia e pedagogia para que estes
apliquem as bases teóricas, inovem o seu fazer e construam a verdadeira
multidisciplinaridade.
3.
EDUCAÇÃO
INCLUSIVA
As primeiras discussões sobre inclusão
foram marcadas pelos movimentos antissegregacionistas, iniciados na França nos
anos 60 do século XX. Foi nos Estados Unidos, no final da década de 1970 e
início da década de 1990, que o movimento pela inclusão ganhou ímpeto. Em 1971, o movimento teve início na Itália, quando uma lei
preconizava que o ensino deveria ser ministrado em salas regulares de ensino
público, exceto nos casos em que o aluno possuísse uma deficiência intelectual
muito grave. Em 1977, outra lei italiana estabeleceu que todas as crianças
fossem inseridas na escola normal, a qual teve que assumir a função de escola
para todos.
No Brasil, o
discurso da inclusão apareceu cedo, nas décadas de 1960\1970, mas somente na
década de 1980 é que começou a se proliferar, ao ser criada, em 1986, a
Coordenação Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência
(CORDE). O objetivo era coordenar as ações das secretarias e instituições
referentes à pessoa portadora de deficiência. O Brasil optou pela construção de
um sistema educacional inclusivo ao concordar com a Declaração Mundial de
Educação para Todos, firmada na Tailândia, em 1990; em consonância com os
postulados produzidos na Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais
Especiais: Acesso e Qualidade, realizada em Salamanca, na Espanha, em 1994.
A Educação
Inclusiva caracteriza-se como um novo princípio educacional cujo conceito
fundamental é dar prioridade à heterogeneidade na classe escolar como situação
proporcionadora de interações entre crianças com situações pessoais das mais
diversas. Nesse contexto, são colocados desafios que só poderão ser enfrentados
através de ações conjuntas envolvendo os profissionais da área e os vários
campos do conhecimento comprometidos com a questão educativa, visto que
necessidades educacionais especiais referem-se a todo e qualquer aprendiz que
experimenta dificuldades no processo de aprendizagem em algum momento de sua
escolarização.
Percebeu-se que o Centro atende crianças com deficiência mental, oferecendo
apoio ao ensino regular e tratamento terapêutico quando necessário. Nesta
perspectiva, as principais síndromes atendidas nesta instituição são: Síndrome
de Down; Autismo; Síndrome de Asperger; Síndrome Cri-Du-Chat (Síndrome do Miado de Gato);
Deficiência Intelectual; e Síndrome de Moebius. Oferece atendimento ainda a crianças
com Paralisia Cerebral.
4.
METODOLOGIA
DO TRABALHO
Com o intuito de
coletar informações importantes e dados mais precisos que viabilizassem a construção
do diagnóstico institucional, o grupo optou por uma metodologia de pesquisa
qualitativa que incluísse a observação de toda a instituição no que se refere à
parte física, administrativa e pedagógica. Na parte pedagógica, foi incluída a
observação da ação nas salas de aula, sendo focada a interação dos professores
com as crianças, o desenvolvimento das atividades e a utilização dos recursos.
González Rey (1997)
afirma que o foco da pesquisa qualitativa é conhecimento da subjetividade,
compreendida como um sistema processual, contraditório e sensível a tensões
estruturantes do indivíduo e do social.
O autor, também,
considera que a relação sujeito-sujeito deve permitir a vulnerabilidade de
ambos diante do imprevisível, de modo a construir novas “zonas de sentido”, que,
por sua vez, permitirão a configuração de um novo conhecimento.
As
zonas de sentido são espaços abertos que concentram formas diversas da produção
teórica ao longo do tempo, estimulando permanentemente novas construções
teóricas, através das quais o homem vai intervindo de forma mais ampla e
profunda sobre a realidade. (GONZÁLEZ REY, 1999, p.14)
Ainda nesta etapa de
coleta de dados, foram consultados documentos internos que continham as
informações técnicas necessárias à compreensão da sistemática de trabalho da
instituição. O grupo utilizou, também, questionários sistematizados aliados ao
recurso da conversa informal com cuidadores das crianças, professores,
coordenadores e equipe técnica.
De acordo com a visão
de homem de Vigotski (2000), o sujeito de investigação é aquele inserido em uma
realidade social, histórica e cultural. Neste entendimento, a realidade é
apreendida como algo complexo, superando modelos dicotômicos e simplistas. “[...]
duas linhas qualitativamente diferentes de desenvolvimento, diferindo quanto à
sua origem: de um lado, os processos elementares, que são de origem biológica,
de outro, as funções psicológicas superiores de origem sociocultural.” (VIGOTSKI,
1984, P.52)
Após a coleta dos dados
obtidos através dos instrumentos utilizados, foi possível clarificar as reais
necessidades contidas nas três hipóteses iniciais de ação.
Diversas foram as
demandas encontradas, carecendo, então, proceder a uma seleção daquelas com
viabilidade de serem trabalhadas e rumar para um projeto de ação imediata com
propostas de atividades que contemplassem esses interesses de forma mais
sistematizada e segura.
As principais ações
propostas oriundas das demandas selecionadas foram: Com os professores – gerenciamento do estresse, elaboração de artigo e discussão com os professores sobre Avaliação na Educação Especial; com os alunos – estudo de casos para
intervenções psicopedagógicas; com os
pais ou responsáveis – realização de oficina do brincar, discussão sobre a
sexualidade na adolescência e vivências para a elaboração do luto pela saída iminente
do Centro de crianças com 15 anos; e
ainda, a participação em uma atividade de integração dos componentes da
comunidade escolar – gincana da criança.
É necessário, no entanto, esclarecer que as atividades foram
desenvolvidas somente às segundas e quartas-feiras à tarde e às terças e quintas-feiras
pela manhã. Não foi possível, portanto, contemplar os grupos de
cuidadores/responsáveis que frequentam a instituição às segundas e quartas-feiras
pela manhã e às terças e quintas-feiras à tarde, devido à organização da carga
horária do estágio e à formação dos horários das crianças já descrita.
5.
DISCUSSÃO
DOS RESULTADOS
As atividades foram
desenvolvidas de forma individual e coletiva. Como atividade individual,
realizamos acompanhamentos psicopedagógicos de caso, como os realizados com a
criança G.M.C. 10 anos, sexo feminino, diagnosticada autista. Foram feitos
cinco atendimentos: anamnese, hora lúdica, intervenção psicopedagógica e sessão
familiar. Percebeu-se um avanço significativo na criança em termos de
relacionamento interpessoal. Ao final, foi trabalhado o reconhecimento de sua
identidade e suas partes do corpo. E o caso de L.L.L., 12 anos, sexo masculino,
diagnosticado Síndrome Cri-Du–Chat, com sério comprometimento cognitivo. Os
primeiros acompanhamentos ocorreram em atendimentos realizados pela
psicopedagoga como uma forma de adaptação do cliente e do grupo. Após esses
contatos, foi possível realizar três atendimentos
psicopedagógicos, sob supervisão, nos quais havia a intenção de provocar
vincularidade entre o cliente e as estagiárias de Psicologia. Foi percebido que
as intervenções utilizadas resultaram no reconhecimento de uma das estagiárias
pela criança e maior tempo de concentração nas
atividades, avanço considerado significativo, dado o grau de
comprometimento do caso.
A Teoria Psicológica da
Subjetividade, formulada por González Rey, legitima o pensamento complexo e
aborda o psiquismo humano como multidirecional, recursivo e contraditório. Para
este autor, a aprendizagem é um processo simbólico-emocional em constante
desenvolvimento, em que a emoção desempenha papel crucial.
As emoções que o
sujeito vai desenvolver no processo de aprendizagem estão associadas não apenas
com o que ele vivencia como resultado das experiências implicadas no aprender,
mas emoções que têm sua origem em sentidos subjetivos muito diferentes que
trazem ao momento atual do aprender momentos de subjetivação produzidos em
outros espaços e momentos da vida. (GONZÁLEZ REY, 2008, p. 34)
À luz do conceito de
subjetividade apresentado por González Rey, consideramos os positivos
resultados obtidos como provenientes da valorização da subjetividade e ao
processo simbólico-emocional destes indivíduos. Muito embora, sempre buscando
ampliação de limites e possibilidades dos mesmos, à medida que foram traçados
objetivos outros a serem alcançados.
O
principal público das atividades coletivas foi formado pelos cuidadores e os
professores. Neste segundo, devido a pouca disponibilidade, somente foi
possível realizar uma única atividade em que participaram metade do corpo de professores
(dezessete profissionais). Foram realizadas ações de relaxamento e treino de
resiliência, pois foi percebido que estes profissionais se encontravam em
elevado nível de estresse com um número considerável de atestados médicos já
tendo sido apresentados à instituição. Tal condição de estresse está
relacionada à dificuldade que eles encontram com a própria prática de ensino
que esta rotina escolar exige: o trabalho com crianças com necessidades
educacionais especiais muitas vezes acaba causando angústia e sensação de
incapacidade. Além disso, existe a ânsia para conseguir alfabetizar as crianças
(que se agrava quando esses professores não conseguem atingir o aprendizado do
alunado) e a ausência de clareza quanto aos critérios utilizados para a organização
das turmas. (RODRIGUES, 2009)
Ao
final da atividade, muitos foram os elogios e as solicitações de outras
atividades semelhantes.
Com
os cuidadores, o grupo teve três preocupações, a primeira foi despertar nos
responsáveis o desejo do momento do brincar com a criança, a segunda foi levar
informações sobre o “adolescer” (a sexualidade) da criança e a terceira foi
trabalhar o luto/perda da saída do Centro.
Da
“Oficina do Brincar” participaram 26 (vinte e seis) cuidadores que se mostraram
bastante atentos e participativos, ao final muitos disseram que iriam repensar
o momento de brincadeira com suas crianças adotando os brinquedos apresentados
durante a oficina.
Tal
oficina objetivou trabalhar o papel da interação social no desenvolvimento da
criança, para além da perspectiva da deficiência. Segundo Rego (1995), Vigotski
chama atenção para a ação recíproca existente entre o organismo e o meio e
atribui especial importância ao fator humano presente no ambiente. Portanto,
assim justifica-se a preocupação com o cuidador como mediador na apresentação
do ambiente à criança, conferindo-lhe um papel de potencializar o aprendizado de
ambos.
Segundo
Brougére (2001), “a criança pequena é
iniciada na brincadeira por pessoas que cuidam dela. [...] A criança entra progressivamente
na brincadeira do adulto, de quem ela é inicialmente o brinquedo, o espectador
ativo e depois o real parceiro”. Uma segunda justificativa seria de
provocar reflexões que propiciassem estreitar os laços afetivos entre os
cuidadores e suas crianças.
A
“Oficina Adolescer/ Sexualidade” foi bastante movimentada, participaram
sessenta cuidadores que estavam bastante interessados e cheios de dúvidas.
Algumas mães apresentaram relatos de suas vivências, bastante queixosas das
dificuldades do dia-a-dia. Esta foi a oficina que atraiu um maior público.
O
terceiro trabalho com cuidadores foi a “Oficina Perdas/Luto” que já era de
conhecimento do grupo ser um tema difícil de trabalhar por envolver questões
sociais, econômicas e, sobretudo, emocionais. Para esse trabalho, nos valemos
das contribuições de autores como John Bowlby (1985), Judith Viorst (1988),
William Worden (1998), Elisabeth Kübler-Ross (2005) dentre outros. Dessa forma,
tínhamos em mente os Estágios do luto, propostos por Kübler-Ross, a Teoria do Apego
e as Fases do processo de luto, de Bowlby, as Tarefas do luto, propostas por
Worden, além das Perdas necessárias,
de Viorst.
Segundo
Kübler-Ross (2005), existem cinco estágios pelos quais as pessoas passam ao
lidar com uma perda significativa. São eles: negação ou isolamento,
cólera/raiva, barganha/negociação, depressão e aceitação. Já Bowlby (1985) nos
diz que são quatro as fases do processo de luto: fase de choque, fase de desejo
e busca da figura perdida, fase de desorganização e desespero e fase de alguma
organização.
Nesse
contexto, Worden (1998) vem propor as tarefas do luto, que são: aceitar a
realidade da perda, elaborar a dor da perda, ajustar-se ao ambiente e
reposicionar a perda em termos emocionais e continuar a vida. Além dessas teorias,
que são base quando se trata de perdas e luto, levamos em conta as perdas necessárias, de que nos fala
Viorst (1988), que seriam as perdas pelas quais todos nós passamos no decorrer
da vida, começando com a própria saída do ventre materno.
Na
representação de morte ou outra perda estão envolvidas duas pessoas: uma que é
“perdida” e a outra que lamenta esta falta. Relacionando a teoria com a
realidade que encontramos nesta instituição de estágio, percebemos que o que
acontece com os pais ao ficarem sabendo - especialmente de forma brusca e
inesperada - que seu filho apresenta algum tipo de deficiência, é uma reação de
desorganização, paralisação e impotência. Tais reações, que pareciam ainda
existir em alguns cuidadores presentes na Oficina, foram explicitadas e refletidas
a partir do encorajamento das estagiárias.
Para
tal oficina, foram selecionados cuidadores de crianças de 12 (doze) a 14
(quatorze) anos, tendo em vista que as crianças deixam o Centro aos 15 anos.
Participaram 17 (dezessete) cuidadores e seus depoimentos eram sempre
carregados de muito sofrimento. Algumas mães emocionaram-se muito e o grupo
acolheu e respeitou aquele momento de fragilidade. Os cuidadores demonstraram
muita angústia e medo em deixar o Centro nos 15 anos de seus filhos, apesar de
não se sentirem plenamente satisfeitos com a instituição. Percebeu-se que este é um conteúdo mobilizador
e que requer um trabalho permanente.
Outras
atividades foram desenvolvidas em paralelo, como a participação na Gincana do
Dia das Crianças, com a arrecadação de brinquedos e promoção de apresentações
artísticas. O grupo, também, realizou produções de artigos científicos acerca
da temática avaliação na educação inclusiva que foram apresentados no Colóquio
2011. Esta última atividade é um evento científico organizado pela Instituição
para a comunidade da cidade de Teresina.
E
por solicitação da assessoria técnica da Instituição, a Oficina de Adolescer/
Sexualidade foi modificada para uma nova aplicação com uma turma de dezesseis professores
em formação em Atendimento Educacional Especializado, da rede pública de
Teresina. Todas as atividades planejadas inicialmente no estágio foram
executadas, não havendo nenhum descarte.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
A
Psicologia Escolar constitui-se em um grande desafio para os psicólogos. Isso
devido às especificidades que envolvem esta área da psicologia. É necessário um
conhecimento aprofundado do desenvolvimento humano, aliado a um saber
científico e cuidadoso do processo de aprendizagem. Deve fazer parte também desses
saberes o conhecimento das relações entre todos os que fazem a instituição
escolar, a exemplo de docentes e discentes e seus familiares.
Desenvolver
um estágio supervisionado em uma instituição de Educação Especial revestiu-se
de um desafio maior ainda, mas pensamos: a inclusão escolar é uma realidade a
que não poderemos mais nos furtar. Por isso, nossa responsabilidade enquanto
psicólogos e educadores é de transformar este desafio em realidade tangível.
As
construções teóricas debatidas em sala de aula acerca das temáticas Educação
Inclusiva, Práxis do Psicólogo Escolar e Processos de Aprendizagem foram muito
válidas. Diante da realidade ali encontrada, pudemos perceber como se dá a
prática do Psicólogo na escola e o quanto é importante sua escuta técnica e
apurada para a compreensão dos diversos segmentos que compõem aquela
comunidade.
Foi
uma experiência plena de resultados positivos a que vivenciamos na instituição. Acreditar nas potencialidades daquelas crianças
com deficiência intelectual e ver que é possível trabalhar com elas no intuito
de proporcionar-lhes mais autonomia em suas atividades diárias é gratificante.
Não é fácil, contudo, nem tampouco rápido em seus resultados, mas percebemos na
instituição como um todo, um acreditar nas possibilidades e investir nelas para
obter sucesso.
Apesar
de ser um Centro de Educação Especial, o trabalho desenvolvido na instituição
está alinhado aos princípios da Educação Inclusiva, pois sua dinâmica visa à
preparação e à manutenção destas crianças no ensino regular. Os Núcleos, da
forma em que foram estruturados, no Centro, dividem-se nos trabalhos de:
estimulação essencial para desenvolvimento motor, cognitivo, social e afetivo;
atendimento intensivo visando à inclusão nos espaços sociais e educacionais;
apoio psicossocial às famílias das crianças assistidas; e, produção de material
pedagógico com o objetivo de propiciar o desenvolvimento integral da criança.
Importante
ressaltar o intercâmbio de aprendizado entre os profissionais do Centro
(pedagogo, psicopedagogo, psicólogo e assistente social), os profissionais da
Rede Regular de Ensino (professor, coordenador e gestor) e familiares, a partir
das visitas feitas pela equipe do Centro às demais escolas e domicílios. Este é
um trabalho que vemos como de fundamental importância para a produção de
conhecimento acerca do processo de inclusão e, por consequência, um facilitador
da manutenção da criança no ensino regular.
Para finalizar,
afirmamos que o estágio Supervisionado em Psicologia Escolar, em um Centro de Educação
Especial, desta Capital, cumpriu seu objetivo, uma vez que nos possibilitou a
prática de aprendizados teóricos anteriores que a experiência somente veio a
endossá-los.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, S. F. C. O Psicólogo no
cotidiano da escola: re-significando a atuação profissional. In GUZZO, R. S. L.
(org). Psicologia Escolar: LDB e
educação hoje. Campinas: Alínea, 2002.
BOWLBY, J. Apego e Perda. São Paulo: Martins
Fontes, 1985.
BROUGÉRE,G.
Brinquedo e Cultura. São Paulo:
Cotez, 2001.
COSTA, C. R.; RONCAGLIO,
S. M.; SOUSA, I. E. R. Momentos em
Psicologia Escolar. Curitiba: Juruá, 2005.
DEL PRETTE, Z. A. P
Psicologia, Educação e LDB: novos desafios para velhas questões? In GUZZO, R.
S. L. (org). Psicologia Escolar: LDB
e educação hoje. Campinas: Alínea, 2002.
GONZÁLEZ REY, F. L. Epistemología cualitativa y subjetividade. São Paulo: EDUC, 1997.
______. La investigación cualitativa em
psicología. Rumos y desafios. São
Paulo: EDUC, 1999.
______. O Sujeito Que Aprende: desafios
do desenvolvimento do tema da aprendizagem na psicologia e na prática
pedagógica. In: TACCA, M. C. V. R. (org). Aprendizagem
e Trabalho Pedagógico. Campinas: Alínea, 2008.
KÜBLER-ROSS, E. Sobre a morte e o morrer. São Paulo:
Martins Fontes, 2005.
MALUF, M. R.
Psicologia e Educação: paradoxos e horizontes de uma difícil relação. I
Congresso Nacional de Psicologia Escolar. ANAIS,
São Paulo: ABRAPEE/PUCCAMP, 1992.
MEIRA, M. E. M.
Psicologia Escolar: pensamento crítico e práticas profissionais. In: TAMANACHI,
E. de R.; PROENÇA, M.; ROCHA, M. Psicologia
e Educação: desafios teórico-práticos. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.
MITJÁNS MARTÍNEZ, A. Criatividade, personalidade e educação. Campinas: Papirus, 1997.
REGO, T. C. Vigotski:
uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes. 1995.
RODRIGUES, M. J. O
sentido subjetivo da docência em educação especial. 2009. 167 f.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Piauí, Teresina,
2009.
SEDUC. Gerência de Educação Especial - GEE. Centro
Integrado de Educação Especial - CIES. Projeto
Político Pedagógico – Projeto Gaivota, 2010.
VIORST, J. Perdas necessárias. São Paulo:
Melhoramentos, 1988.
VYGOTSKY, L.S. A
formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
______. Manuscrito de 1929. Educação & Sociedade, XXI (71), 23-44, 2000.
______. O
desenvolvimento psicológico na infância. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
WORDEN, W. Terapia do Luto. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1998.
Nenhum comentário:
Postar um comentário