ANÁLISE
DE CASO DE PEDRO ALONSO LOPEZ
Autora: Ludmilla Muniz Machado
Autora: Ludmilla Muniz Machado
Este trabalho tem o propósito de analisar o caso do criminoso
Pedro Alonso Lopez à luz da Gestalt, enfatizando o olhar sobre o fenômeno, o
ciclo do contato, funções do self, teoria de campo e resistências adotadas pelo
sujeito; propondo, assim, um melhor entendimento acerca fenômeno criminal.
Pedro Alonso Lopez, conhecido como “Monstro dos Andes”, nos
anos 80, foi acusado e cumpriu várias condenações por matar e estuprar mais de
300 meninas em vários países da América da Sul. Ele foi preso e posto e liberdade
algumas vezes, chegando, inclusive, a ser declarado insano, período em que
cumpriu internação em um Hospital Psiquiátrico em Bogatá. Em 2002, foi
novamente detido, por autoridades colombianas, acusado de mais um assassinato.
Na Gestalt, o fenômeno é tratado como um todo que não pode
ser decomposto em fatores menores, a fim de não perder características
particulares que vão além de suas partes constitutivas. Segundo Ginger (2010),
a Gestalt apresenta uma perspectiva de ser humano apreendido em sua globalidade
de interação sistêmica em suas dimensões sensoriais, afetivas, intelectuais,
sociais e espirituais.
Diante desta perspectiva holística de homem, façamos, então, um
levantamento da história de vida de Lopez. Sua mãe foi uma prostituta e ele
teve 12 irmãos. Lopez foi expulso de casa aos 8 anos de idade, ao ser flagrado,
pela mãe, acariciando a irmã mais nova. Neste período, foi sodomizado por um
pedófilo. Tempos depois, fugiu de um orfanato onde estava abrigado. Entendemos
que tenha sido molestado por um professor da Instituição. Na prisão, aos 18
anos, foi estuprado e matou 3 criminosos. Depois deste período preso, começou a
assassinar meninas no Peru, contabilizando um total de 100 garotas.
Até então, percebemos que as vivências experienciadas por
Lopez, em especial na infância, foram bastante negativas e degradantes. Vimos uma
mãe acusadora que não cumpriu seu papel materno em suprir o filho de alimento
afetivo, intelectual e/ou espiritual. Identificamos, também, um violento corte
na relação com sua família, seguido da permanente experiência de abandono. E,
por fim, repetidas experiências de violência sexual.
Perls e Goodman, ao elaborar a Teoria do Self, tomaram por
base o pressuposto de que toda experiência deve ser entendida como um ciclo. De
acordo com Ponciano (2007), a Gestalt está centrada no conceito de contato e na
natureza das relações do contato da pessoa consigo mesma e com mundo exterior. Fenômeno
cíclico que se retroalimenta. A Teoria do Self, também conhecida por Ciclo do
Contato ou por Ciclo da Satisfação das Necessidades, consiste na ação individual
ou na interação relacional que se desenrola em quatro principais fases: pré-contato, fase das sensações,
durante a qual a percepção ou a excitação nascente no corpo (geralmente por um
estímulo do meio) tornar-se-á a figura que solicita o interesse do indivíduo; contato, fase ativa, quando o indivíduo
consegue definir a figura e vem acompanhada de uma emoção; contato final, coesão entre a percepção, a emoção e o movimento, um
contato pleno; pós-contato, fase da
assimilação, o indivíduo pronto para entrar em outro ciclo. O curso deste ciclo
proporcionaria ao indivíduo seu ajustamento criativo, ou seja, uma interação
ativa e personalizada que se produz na fronteira de contato entre o indivíduo
sadio e o meio.
A cada etapa do ciclo, o self funciona de maneiras diferentes
e aparecem novas figuras, ou seja, o centro de interesse se desloca. Singer
(2010) afirma que no curso das diferentes etapas do Ciclo do Contato, o self
(atual modo de adaptação ao meio ambiente) modifica-se, funcionando em três
modos principais: id, pulsões
internas, necessidades vitais, apresentando-se na tradução corporal; eu, função ativa, escolhas como base
nas necessidades e desejos; e, por fim, personalidade,
é a representação que o sujeito faz de si mesmo, sua auto-imagem, assegura
a integração de outras experiências anteriores e constrói um sentimento de
identidade.
Diante do exposto,
pontuamos que o meio desfavorável em que Lopez se encontrava, enquanto criança
e adolescente apresentou-lhe sensações, emoções e percepções que o atravessaram
e o impediram de assimilar de forma assertiva tais experiências. Fato que não
lhe permitiu um fechamento completo de seus Ciclos de Satisfação das
Necessidades. “A vivência do campo depende da experiência do campo, cuja
qualidade altera a experiência imediata vivida pelo sujeito em um dado momento”
(PONCIANO, 2007, p. 27).
Um ciclo interrompido causa distúrbios no funcionamento deste
self, que na Gestalt, são chamados de resistências. “Elas podem constituir
mecanismos de defesa apropriados à situação, ou, ao contrário, bloqueios
anacrônicos que se tornam rígidos, atestando um funcionamento patológico de
evitação do contato autêntico.” (GINGER, 2010, p. 185)
Ele entrevistas dadas ainda em celas de prisão, Lopez se
descreve como “o homem do século” e se dizia ter “bom comportamento”,
justificando sua libertação da prisão. Ele descreve suas vítimas como “meninas
suaves, confiantes e inocentes”. Matava cerca de 3 vítimas por semana. Perls
considera a agressividade como indispensável para conservar nosso lugar no
mundo, mas este conceito não pode ser confundido com a violência destruidora.
De forma positiva a agressividade é a conquista do meio ambiente, permitindo
ser reconhecido e existir em um espaço e tempo. Porém em sua valência negativa há
uma dominação invasiva, sem respeito pela necessidade de assertividade do
vizinho, ou seja, há uma invasão do lugar do outro.
Retomando a história de vida e Lopez, percebemos, ainda, que
por várias vezes e foi preso e libertado em um curto espaço de tempo, o que possibilitou
que em seus momentos em liberdade continuasse a praticar seus crimes. Confessou
ter praticado mais de 300 assassinatos.
A Gestalt enfatiza a percepção e aprendizagem e propõe
construções fisiológicas para explicar o comportamento. Tal pressuposto veio de
encontro ao trabalho de Kurt Lewin que afirma:
“[...] o campo no qual o indivíduo está inserido possui estímulos que
foram um intricado mosaico de possibilidades, cabendo ao indivíduo
decodificá-lo através da percepção. A inclusão dessa realidade externa
possibilita uma ampliação da compreensão do funcionamento global do indivíduo,
pois se considera tanto externo como a realidade interna de cada um.” (KIYAN, 2006,
p. 120)
O Espaço Vital, outro termo utilizado por Kurt Lewin,
corresponde à somatória de um círculo fechado (campo) e o meio psicológico,
sendo que é neste espaço que o comportamento se manifesta, revelando sua
relação estabelecida com o mundo. “Esse espaço corresponde ao universo
psicológico de cada um” (KIYAN, 2006, p. 122).
Correlacionando os conceitos dinâmicos da teoria de campo e os
aspectos criminológicos, temos:
·
Energia:
força presente no ser humano, capaz de mobilizá-lo a ação. Como representação
dessa forma, temos a própria agressividade do indivíduo, característica inerente
ao seu self;
·
Tensão:
estado alterado entre de determinada região em relação com outra. Barreira que
separa o indivíduo (meio psicológico) e o meio. A tensão na barreira pode ser
representada pelo poder de Polícia, Leis e punições permitindo ou possibilitando
a ação criminosa;
·
Necessidade:
quando a tensão em uma determinada região leva a necessidade de satisfação
desta, tão logo ocorra, restaura-se o equilíbrio do indivíduo. O indivíduo
apresenta a necessidade da prática criminosa como uma forma de reestabelecer
seu equilíbrio, em decorrência de seu funcionamento patológico;
·
Valência:
valor atribuído a cada necessidade. Dependerá da percepção e as aprendizagem
que o indivíduo teve em relação ao crime para que ela assim possa atribuir
polaridades positivas ou negativas à sua ação.
·
Vetor:
direção, energia e ponto de aplicação para obter-se o desejado. A motivação do
indivíduo para a prática criminosa.
No caso em questão, Lopez a partir das experiências
vivenciadas construiu em sua personalidade a pulsão de agressividade de forma
não assertiva em relação ao outro. A tensão que o separa da prática criminosa
não é barreira suficiente para impedi-lo de cometer crimes, pois a valência
atribuída à sua necessidade de satisfação foi julgada positiva diante das
brandas punições apresentadas; fato, este, que o direcionou e lhe produziu
energia para praticar mais de 300 assassinatos.
Para concluir, podemos afirmar que a Teoria da Gestalt tem
muito a contribuir para a Psicologia Jurídica. O seu entendimento de homem como
um ser no mundo, constituído a partir da interação organismo, ambiente e
histórico; e capaz de realizar escolhas segundo suas próprias necessidades e
desejos nos apresenta importantes revelações acerca do fenômeno criminal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
GINGER, S. Gestalt:
a arte do contato: uma nova abordagem otimista das relações humanas; tradução
de Lúcia M. Endilich Orth. – 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.
KIAN, A. M. M. E a
Gestalt emerge: vida e obra de Frederick Perls. São Paulo: Editora Altana, 2006.
PONCIANO, J. R. O
ciclo do contato. Brasília: Editora Ser, 1995.
Parabéns pela proposta. Mas na minha opinião é um erro tentar se aprofundar no sujeito, antes (e até depois, em certa medida) de dar voz a ele. Isto acaba proporcionando compreensões que só ajudam a cada vez mais ocultar o ser.
ResponderExcluirMas parabéns pela clareza dos conceitos, e concordo contigo que a Gestalt tem muito a contribuir na Psi Jurídica.